Depois de sua terceira volta ao mundo, do sétimo ano de viagem, da vigésima quinta amante e da trigésima infecção intestinal, Enrico Nuñez estava cansado. Decidiu que, a partir do próximo momento que pisasse no lugar onde um dia foi sua casa, ao invés de tentar desesperadamente fazer parte do mundo, faria o mundo fazer parte dele, agora de uma vez por todas.
Cansado de rodar ao contrário da rotação da Terra (insistia em dizer que isso o rejuvenescia), cansado de não entender as estações do ano, com medo das doenças venéreas globais e de perder sua capacidade digestiva, Enrico queria parar. Como sabia que todas as lembranças não durariam mais de 10 anos: as fotos clareiam, os suvenires quebram e as memórias somem; ele agora ia se tornar seu próprio mundo, e tornar da sua auto-exploração a próxima atividade de ócio (e de vida).
Para não sofrer tanto de saudade e não se perder nessa transição do macro para o micro, Nuñez, que não era gordo, ia se dividir em fatias como os homens fizeram com a Terra. O homem escolhido para o trabalho de início não apoiou a empreitada, mas, como bom tatuador que era, enfim entendeu a proposta e garantiu a qualidade do serviço. Enrico teria trópicos: o do ártico na altura do pescoço, o de câncer nos braços, o equador na cintura, o de capricórnio acima dos joelhos e o antártico nos tornozelos.
Pois bem. Enrico se tatuou, depois vendeu seu barco e voltou pro seu sítio na bahia, casou, teve dois filhos, pratica taichi e vende café orgânico numa feira de ilhéus, todo domingo.
4 comentários:
hahahaha
Vc tá demais, hein, crucru.
O mais comum é o oposto, né? Fiel ao trabalho decide abandonar tudo e seguir rumo a todos os trópicos possíveis.
Enrico moderninho tá de parabéns :D
enrico é tipo um universo paralelo meu ?
ou seu ? :~
Demais esse texto.
Faz um desenho pra mim depois?
Enrico do Ybiti Nuñez
melhor...Me dá esse do Enrico Nuñez?
hein hein
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